Fundo Eleitoral é imoralidade prevista pela legislação eleitoral
- Gi Palermi
- 6 de ago. de 2022
- 4 min de leitura
Boa parte da população é contrária à destinação dos recursos, mas candidatos fazem uso do dinheiro.

Recurso oriundo das contas públicas previsto para irrigar os cofres dos partidos políticos, o Fundo Eleitoral, conhecido popularmente como “fundão”, é uma daquelas imoralidades previstas pela legislação eleitoral em que os candidatos deixam a responsabilidade com relação ao futuro da verba para a pressão popular. Embora pesquisas revelem que boa parte da população brasileira é contrária à destinação dos recursos, a maioria dos candidatos que disputam a Presidência da República faz uso do dinheiro para bancar suas estruturas de eleitorais.
Só neste ano, o Congresso Nacional destinou aos candidatos R$ 4,9 bilhões. Para se ter uma ideia do que significa esse montante usado para a campanha política poderia pagar duas vezes o valor previsto para o auxílio aos taxistas, que terá um total de R$ 2 bilhões. O montante é mais que o dobro do que foi gasto nos anos eleitorais de 2018 e 2020, primeiras duas edições do fundão, quando os congressistas aprovaram R$ 1,7 bilhão e R$ 2 bilhões, respectivamente.
Para as eleições de 2022, o Congresso Nacional aprovou um Fundo de R$ 4,9 bilhões. O presidente Bolsonaro vetou o texto, mas o veto foi derrubado pelo Congresso Nacional. O veto foi primeiro analisado na Câmara e os deputados o derrubaram por um placar de 317 votos a 143. No Senado, foram 53 votos pela derrubada do veto e 21 por sua manutenção. No Senado, assim como na Câmara, o assunto foi alvo de debates.
Dos 317 deputados que foram favoráveis à destinação do montante para campanha eleitoral, 33 são representantes de Minas Gerais.
São eles: Aécio Neves (PSDB); Aelton Freitas (PL); Charlles Evangelista (PP); Diego Andrade (PSD); Dimas Fabiano (PP); Domingos Sávio (PSDB); Eduardo Barbosa (PSDB); Euclydes Pettersen (PSC); Fábio Ramalho (MDB); Franco Cartafina (PP); Fred Costa (Patriota); Gilberto Abramo (Republican); Greyce Elias (Avante); Hercílio Diniz (MDB); Lafayette Andrada (Republican); Leonardo Monteiro (PT); Lincoln Portela (PL); Luis Tibé (Avante); Marcelo Aro (PP); Mário Heringer (PDT); Mauro Lopes (MDB); Newton Cardoso Jr (MDB); Odair Cunha (PT); Padre João (PT); Patrus Ananias (PT); Paulo Guedes (PT); Pinheirinho (PP); Reginaldo Lopes (PT); Rodrigo de Castro (PSDB); Rogério Correia (PT); Vilson da Fetaemg (PSB); Zé Silva (Solidaried); Zé Vitor (PL).
O atual valor do Fundo Eleitoral foi distribuído pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) entre os 32 partidos políticos registrados na Corte Eleitoral. De todas as legendas com candidatos à Presidência da República, apenas o Novo, cujo candidato é Felipe D’Ávila, renunciou ao repasse dos valores a que teria direito (R$ 90 milhões). A cota do partido, neste caso, será revertida ao Tesouro Nacional. Já Ciro Gomes (PDT), Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Jair Bolsonaro (PL) e Simone Tebet (MDB) têm no fundão a coluna vertebral que banca as estruturas de suas campanhas.
Neste ano, o PL de Jair Bolsonaro terá direito a R$ 288,5 milhões. O PDT de Ciro Gomes embolsará R$ 253,4 milhões. PT terá de Lula terá R$ 503 milhões, e o MDB, de Simone Tebet, R$ 363 milhões. Os recursos do Fundo Eleitoral devem ser usados exclusivamente no financiamento das campanhas eleitorais, e as legendas devem prestar contas do uso desses valores à Justiça Eleitoral. No caso de haver recursos não utilizados, eles deverão ser devolvidos para a conta do Tesouro Nacional.
Como é distribuído o fundão
Do total de recursos do Fundo Eleitoral, 2% são distribuídos igualitariamente entre os partidos, mas o depósito final no cofre de cada candidato é variado, a depender de tópicos, como o número de candidatos eleitos nas eleições gerais de 2018, incluindo as atualizações nas bancadas feitas até 1º de junho de 2022. Dessa forma, a contagem é feita: 35% para as legendas que elegeram pelo menos um deputado federal; 48% proporcionalmente à representação de cada legenda na Câmara dos Deputados; e os 15% restantes divididos com base na proporção da representação no Senado Federal.
Segundo uma pesquisa do Instituto Millenium divulgada neste ano, o valor de R$ 4,9 bilhões do Fundo Eleitoral de 2022 é alvo de críticas por mais de metade da população brasileira. Na análise de Marina Helena Santos, economista, diretora-executiva do Instituto Millenium e coautora do levantamento, o próximo presidente da República precisa ter a noção de que os brasileiros são contrários ao montante bilionário usado para regar as eleições.
“Como mostramos na pesquisa, quase toda a população brasileira é contra o valor de R$ 5 bilhões para o fundão e grande parte, 59%, é contrária à existência desse mecanismo”, disse Marina. “O político tem de ter em mente que ficará sem apoio do brasileiro, caso queira aprovar um fundão com um valor bilionário, como o que foi aprovado em 2022.”
Para Marina Helena, além do valor, parte da população entende que o fundão é uma maneira de perpetuar políticos no poder — e por isso é tão contrária ao mecanismo. “Eu vejo que um dos objetivos do fundão é impedir uma renovação do quadro de congressistas”, afirma, “porque os políticos usam os cofres públicos para construir uma campanha com a finalidade de se reelegerem por inúmeros mandatos.”
Contra escândalos, nasceu o Fundo Eleitoral
O Fundo Eleitoral é novato na política brasileira. Até 2017, o financiamento de campanhas era feito por pessoas jurídicas (PJ), mas inúmeras ilegalidades foram flagradas no processo, o que resultou em mudanças na legislação. Exemplos de irregularidades não faltaram, em ações que resultaram em condenações oriundas de processos de corrupção envolvendo os recursos públicos, como demonstrou a Operação Lava Jato. Era comum as empresas que mais efetuaram doações eleitorais serem justamente as maiores beneficiárias de empréstimos com bancos públicos, tais como do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e da Caixa Econômica Federal.
“É provável que os próximos políticos eleitos, sejam eles do Legislativo ou do Executivo, sejam cada vez mais cobrados quando o assunto é Fundo Eleitoral”, Milla Maia, CEO do Instituto Millenium
A empresa JBS S.A., dos irmãos Wesley e Joesley Batista, segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), foi a maior doadora na campanha eleitoral de 2014, desembolsando, oficialmente, a quantia de R$ 4 milhões à então candidata Dilma Rousseff, do PT.
O negócio dos irmãos Batista foi um dos maiores “sócios” do BNDES, tendo recebido cerca R$ 7,6 bilhões em empréstimos do banco público. Foi exatamente para minimizar os desvios de recursos que as doações de empresas foram proibidas pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Para substituir o modelo, a solução pelo Congresso foi usar os recursos públicos para financiar as eleições nacionais.
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