Prefeitura de Araxá contrata parentes de vereadores
- Gi Palermi
- 19 de mai. de 2022
- 5 min de leitura
Atualizado: 20 de mai. de 2022
Pelo menos quatro vereadores tem parentes nomeados em cargos em comissão. A suspeita é que a Prefeitura estaria comprando apoio político na Câmara Municipal.

Duas nomeações publicadas recentemente no Diário Oficial do Município de Araxá (e-DOMA) despertaram a curiosidade dos eleitores mais atentos e levantaram a suspeita de que esteja ocorrendo “nepotismo interinstitucional” entre os poderes Executivo e Legislativo em troca de apoio político.

A suspeita é que a Prefeitura estaria nomeando pessoas que são ligadas por vínculos de parentescos a vereadores para assegurar a formação de dois terços na Câmara. O quórum tanto garante a aprovação em primeiro turno da maioria dos projetos de interesse do Executivo quanto impede a abertura de Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigação de qualquer tema em suspeição.
Um dos casos denunciados pelas redes sociais envolve a mulher do vereador Wellington Alves Martins, popularmente conhecido como Wellington da Bit (PSD). Joice Aparecida Pereira é servidora pública concursada na Secretaria Municipal de Educação. Mas no dia 30 de abril foi nomeada para coordenadora do Polo de Apoio Presencial da Universidade Aberta do Brasil (UAB) do município de Araxá.

Também ocupa cargo em comissão na Prefeitura a mulher do vereador Odirley Henrique da Rocha, popularmente conhecido por Dirley da Escolinha (PROS). Cintia Debora Ferreira de Castro Vieira está lotada na Secretaria de Saúde, no cargo de Assessora de Coordenação de Serviços Gerais de Saúde - Nível 4.

Outro vereador com parente em cargo na Prefeitura é João Bosco Junior (AV). A companheira do vereador, Danielle Oliveira Pinheiro, está lotada na Procuradoria Geral do Município no cargo de Assessora Especial - Nível 2.

Outra situação que tem sido questionada por eleitores nas redes sociais envolve a nomeação da filha do vereador João Ferreira Veras Neto (PSD). Bárbara Melo Veras foi nomeada para o cargo em comissão de Assessora de Cadastro Tributário na Secretaria Municipal de Fazenda, Planejamento e Gestão, no dia 2 de março. Curiosamente, um dia depois, em 3 de março, a Câmara Municipal de Araxá, por 11 votos a quatro, se negou a abrir uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para apurar a denúncia do estoque de insumos odontológicos vencidos flagrados no almoxarifado da Prefeitura e os eventuais prejuízos causados aos usuários do Sistema Único de Saúde.
As nomeações estariam em desacordo com a Súmula Vinculante 13 do Supremo Tribunal Federal (STF) que diz:
“a nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança ou, ainda, de função gratificada na administração pública direta e indireta em qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola a Constituição Federal”.
O que dizem os citados
Para o vereador Wellington Alves Martins as suspeitas não procedem. Por nota enviada por e-mail o vereador disse que sua esposa é servidora concursada do município há mais de 20 anos. Acerca da nomeação ao cargo de coordenadora, ele afirmou que ela o ocupa desde o ano de 2008. “Informação esta também que pode ser comprovada junto à Prefeitura Municipal”, acrescentou.
O vereador Odirley Henrique da Rocha também exaltou a "vasta experiência na área de atuação profissional" da esposa e lembrou que a mesma é servidora municipal há 10 anos.
"Quanto à questão levantada acerca de suspeita de nepotismo institucional ou cruzado, juridicamente falando, podemos afirmar que Cintia não se enquadra na situação, haja vista que Nepotismo é aquele em que o agente público nomeia a pessoa ligada a outro agente público enquanto a segunda autoridade nomeia uma pessoa ligada por vínculos de parentesco ao primeiro agente, como troca de favores, também entendido como designações recíprocas", enfatizou.
O vereador João Bosco Junior informou que a companheira possui formação acadêmica em Direito e é devidamente inscrita na Ordem dos Advogados do Brasil desde o ano de 2012. Possui longa experiência na área de gestão pública comprovada pela prestação de serviços já realizados na Câmara Municipal e Prefeitura Municipal de Patrocínio, Prefeitura Municipal de Serra do Salitre, além da Câmara Municipal de Araxá. Assim, devido sua capacidade técnica foi nomeada no início da gestão do atual prefeito municipal para exercer um cargo na Procuradoria Geral do Município de Araxá. Informou ainda que não existe “nepotismo cruzado”, uma vez que o Prefeito Municipal não possui parentes lotados no gabinete do vereador e nem “nepotismo interinstitucional”.
O vereador João Ferreira Veras Neto informou que sua filha é advogada da área de Direito Público (Constitucional), com pós-graduação, e possui segunda graduação em Ciências Contábeis e experiência nesta área. Disse ainda que sua filha foi convidada pelo assessor da Secretaria da Fazenda para fazer parte da equipe na área de licitação. “Área extremamente difícil e com escassez de profissionais habilitados no mercado”, acrescentou.
João Veras lembrou ainda que “o caso em questão, não se caracteriza nepotismo, por quanto o município assinou um TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) com o Ministério Público, permitindo que existam seis cargos na Prefeitura que possam ser ocupados por parentes de agentes políticos”, afirmou.
Termo de Ajustamento de Conduta
O Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) mencionado pelo vereador João Ferreira Veras Neto foi firmado entre a Prefeitura Municipal de Araxá e o Ministério Público de Minas Gerais em 2008 e previa que excepcionalmente seis nomeações de parentes de vereadores seriam permitidas, se limitando essas vagas a duas contratações de secretários municipais, duas de assessores e duas de chefes de Departamento.
Em 3 de outubro de 2019 foi realizado um Termo de Aditamento com eficácia plena que mudava os cargos, passando a ser permitidas quatro nomeações de assessores e duas de chefes de departamento, alteração que permanece em validade.
Em entrevista a uma rádio local o promotor de Justiça e curador do Patrimônio Público de Araxá, Marcus Paulo Queiroz Macêdo, também responsável pelo firmamento do TAC, disse que o “aditamento foi feito para deixar claro no TAC que secretários municipais não podem ser contratados em situação de nepotismo com relação ao cargo de vereador. A Súmula Vinculante do Supremo Tribunal Federal permitiria em princípio e o aditamento não permite, o que é mais interessante na nossa avaliação”, pontuou.
O promotor esclareceu ainda que “a Constituição não fala exatamente o que é o nepotismo, mas fala em princípio de moralidade da pessoalidade da impessoalidade e da legalidade. Independente de TAC ou de súmula, se for caracterizada algum tipo de situação concreta em que haja a compra de apoio político por meio de algum tipo de contratação ou nomeação, isso fere a Constituição da República. Havendo uma prova de que houve uma nomeação em troca de uma votação na Câmara Municipal, haveria sim uma situação contrária à Constituição da República. Isso poderia eventualmente ensejar o afastamento da pessoa por meio de um pedido judicial”, declarou.
Nepotismo
O Nepotismo ocorre quando um agente público usa de sua posição de poder para nomear, contratar ou favorecer um ou mais parentes. O nepotismo é vedado, primeiramente, pela própria Constituição Federal, pois contraria os princípios da impessoalidade, moralidade e igualdade. Algumas legislações, de forma esparsa, como a Lei nº 8.112, de 1990 também tratam do assunto, assim como a Súmula Vinculante nº 13, do Supremo Tribunal Federal. No âmbito do Poder Executivo Federal, o assunto foi regulamentado pelo Decreto nº 7.203, de junho de 2010.
Sem resposta
Por meio da assessoria de imprensa, a Prefeitura de Araxá foi procurada para se manifestar sobre o assunto, mas não deu retorno.




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